sábado, 15 de maio de 2010

Este artigo é um pouco extenso, mas vale a pena ler, ele traduz a realidade de obras como a do RODOANEL

O RODOANEL NA POLÍTICA DE EXPANSÃO METROPOLITANA: QUEM PAGA A CONTA?
Renato Arnaldo Tagnin
O Rodoanel é uma rodovia proposta pelo governo estadual, para responder a problemas de congestionamento de veículos e de fluxos de carga que atravessam a Região Metropolitana de São Paulo.
Como vem evoluindo a metrópole e quais poderão ser os efeitos dessa solução?É freqüente ouvirmos comentários e lermos nos jornais que a ocupação urbana aqui é caótica, irregular ou desenfreada. Dito assim parece um problema sem causas ou responsáveis, portanto, fica impossível pensar e agir para alterar essa situação. Procuremos analisar algumas pistas.
Depois do grande crescimento econômico e populacional, que durou até o começo da década de 1980, a área urbana da metrópole continuou crescendo, mostrando uma expansão que não se baseia no desenvolvimento industrial, na oferta de empregos e nas grandes migrações do passado.
Ao se analisar os dados e os estudos feitos sobre o crescimento da área ocupada e o adensamento populacional da metrópole, o que se observa? Em primeiro lugar, a metrópole já não cresce tanto em termos populacionais. Em segundo lugar, as áreas centrais, mesmo com todos os prédios em construção estão com cada vez menos moradores, deixando sua infra-estrutura em parte ociosa e, em contrapartida, as periferias não param de se expandir. Em terceiro lugar, as periferias que crescem
seguem uma ordem e apresentam uma configuração homogênea; portanto, não são “caóticas” ou “irregulares”.
Esse processo mostra uma lógica: todos querem morar bem e próximos de tudo que interessa: emprego, infra-estrutura e equipamentos públicos, creches, hospitais, meios de transporte de massa etc. Ocorre que, nos locais onde existem essas condições básicas para se viver numa cidade o preço dos imóveis sobe e quem não pode pagar e realmente precisa dessas condições – a população mais pobre - tem de se afastar.
Afastar para onde? Para qualquer lugar, onde for possível sobreviver.
Quanto mais distante, precário, inseguro e desprovido de qualquer assistência
governamental ou amparo legal for esse lugar, mais barato viver ali. Nesses locais, o jeito é buscar improvisar a moradia em pedaços de lotes, divididos com outras pessoas e construí-la com materiais precários, saneamento improvisado, sem acabamento, encostada a outras, sem espaços suficientes para ventilação ou iluminação
adequadas, sobrando ruas ou passagens estreitas e sem condições de acesso a caminhões de coleta de lixo, a bombeiros, ambulâncias, dificultando até mesmo escapar em caso de incêndio, bastante provável, também, pela precariedade das instalações de gás e eletricidade.
Penduradas em barrancos, ou na beira de córregos, cada uma dessas moradias abriga várias famílias, com muitas crianças morando juntas, muitas vezes rodeadas por esgoto e lixo.
Como se pode observar, essa situação é comum em toda a periferia e nada tem de caótica ou irregular. Ao se ter contato com essa realidade, fica difícil não se escandalizar e questionar a falta de políticas, como a de habitação, transportes, mananciais etc. Será que elas não existem?
Política é normalmente conceituada como o que um governo escolhe fazer, ou ele
escolhe não fazer e o resultado das duas atitudes.
Vamos, então, observar como essas escolhas e efeitos nos permitem identificar quais são as políticas aqui praticadas pelos governos.
Ao privilegiarem melhorias em determinadas regiões, como nas áreas centrais, sem se dedicarem a criar condições para que as populações mais pobres permaneçam nessas áreas e se beneficiem dos investimentos, os governos têm promovido a transferência de mais renda do setor público (a nossa) para os proprietários dos imóveis melhor
localizados, que têm renda suficiente para mantê-los; resultado:
empurram os mais pobres para fora desses locais. Essa é uma das formas pelas quais os governos têm continuado a concentrar a renda em pequena parcela da população e promovido a conhecida exclusão social de grande parte da população.
Infelizmente, como muitos estudos confirmam, a nossa região tem ajudado o Brasil a ser um dos maiores campeões do mundo em exclusão social e concentração de renda. Na medida em que outras oportunidades,como a oferta de empregos, também se concentram nas áreas centrais, fica mais fácil entender como a falta de perspectivas dignas permite à criminalidade recrutar tantos jovens, aumentar os níveis de violência
na cidade e comprometer o futuro de todo o mundo.
Acontece que, além da mão de obra barata, que chegue com boa aparência e pontualmente para trabalhar, quem mora nos locais privilegiados da cidade precisa de outras coisas da periferia: água, qualidade do ar, controle de enchentes, um clima mais equilibrado, produtos agrícolas, lenha e carvão, areia e pedras para construção e locais para dar um ‘sumiço’ no lixo e nos esgotos.
As alternativas habitacionais para essa parcela da população pobre, quando existem, também são oferecidas nesses locais distantes, porque o investimento governamental na compra dos terrenos é menor. Uma vez ocupados esses lugares, com muita pressão política legítima das populações, algum nível de investimento em infra-estrutura pode ser conseguido, ao longo do tempo. A partir daí, o processo de valorização
dos imóveis e expulsão dos que não podem pagar passa a ocorrer também nessas periferias, alimentando a contínua busca de novos espaços viáveis, por parte daqueles que não podem arcar com os benefícios.
Esses espaços “viáveis” são criados, em geral, com a retirada da vegetação que sobrou fora da cidade, que ainda ajuda na produção e preservação da água.
Anos atrás, pela sua raridade e importância, a faixa que ainda tinha algum nível de vegetação em torno da metrópole, em boa parte já considerada legalmente como de ‘proteção aos mananciais’, passou a ser chamada ‘Cinturão Verde da Cidade de São Paulo’, ganhando o reconhecimento internacional da UNESCO, como ‘Patrimônio da
Humanidade’. Aqui, infelizmente, além de alguns institutos de pesquisa e organizações sociais que não têm meios para protegê-las, esse patrimônio não é reconhecido pelos nossos governantes.
O resultado é que a política metropolitana tem utilizado a periferia para esconder seus problemas, a sujeira que a região produz e as populações que exclui. O pior é que, nela há áreas frágeis e de importância fundamental, onde a vegetação protege locais sujeitos a deslizamentos, segura a água que pioraria as inundações da cidade e
produz aquela que bebemos. Nessas áreas, os problemas estão alcançando diretamente as represas, as nossas caixas d’água.
Vocês sabem como elas estão? É difícil conhecê-las sem se escandalizar com o cheiro, com o que bóia e afunda ali. Há ainda o que proteger, mas não por muito tempo!
As políticas governamentais vigentes estão claramente reforçando esse processo de avanço, sem a imposição de qualquer controle. É como construir um carro com um
potente acelerador, sem equipá-lo com volante ou freio!
Quando os governos escolhem o que vão gerir, em que gastar, que serviços prestar, que obras fazer, onde e, principalmente, para quem elas se destinarão eles determinam a maior parte dos movimentos de valorização imobiliária que comandam a expansão, o adensamento, a qualidade de vida e o desenvolvimento de uma região.
No caso da metrópole paulistana, a responsabilidade principal da sua gestão tem sido do governo estadual, mesmo hoje em que há regulamentos– ainda não aplicados aqui - que determinam uma maior democratização dessa gestão.
Além de ser o responsável maior por essa política metropolitana de expansão urbana, concentração de renda, exclusão social e degradação ambiental, acima descrita, o governo estadual é o proponente e o empreendedor do Rodoanel. O que uma coisa tem a ver com a outra?
Por falta de espaço, não trataremos aqui de todas as deficiências do projeto, como é o caso dos precários levantamentos utilizados para justificar a sua “demanda”, o simplório leque de opções estudado, sem adequado debate (mais uma evidência da falta de democratização da gestão metropolitana), além da crônica falta de investimentos em
transporte público, como atesta a pífia rede de trens e metrô.
De todas essas deficiências, e mesmo como resultado delas, aqui interessa destacar que o Rodoanel vai ocupar as últimas áreas livres e verdes da metrópole. Por quê?
É mais barato! Essa opção é coerente com a política já apontada, que também não atribui valor algum à produção de água, ao controle de enchentes, ao equilíbrio climático e ao controle da poluição que essas áreas ainda realizam e que garantem alguma condição – cada vez mais precária – de vida na metrópole.
A imprensa ajuda a tornar essas áreas baratas e a isentar os governantes pela sua perda. Ultimamente, a abordagem mais freqüente que lemos nos jornais é a de que “Chuva causa enchente” e que mais obras serão necessárias. Quando falta água, é por que ‘não choveu’ e tome aí mais obras; sempre com o nosso dinheiro, claro! Mesmo quando pode ler jornais, a população não tem muitas perspectivas de avançar
no conhecimento, para sair dessas ‘arapucas’ e melhorar sua condição de vida.
Na medida em que perdemos esse potencial de prevenir a falta de água e as enchentes, pela destruição sucessiva das condições naturais que fazem isso de graça, a brincadeira sai cara e o dinheiro, curiosamente, beneficia os mesmos grupos – os que fazem as obras, os que as inauguram e os que ainda poderão continuar morando nos locais que as receberam.
Além de se constituir numa obra extensa e larga, o projeto do Rodoanel, tal como está proposto, precisa de uma pista com pequenas inclinações, para facilitar um grande volume de tráfego em alta velocidade. Para isso, há duas opções: colocá-lo sobre viadutos, ou apoiá-lo no solo, cortando e aterrando o terreno em todo o percurso, principalmente nos mananciais, onde ele é mais acidentado. Por mais cuidados que se tome, desmatar e aterrar esses locais acaba com suas nascentes de água, permitindo que ali aconteça tudo, menos a produção de água - função que define o que é um ‘manancial’.
Para assegurar que a obra não fará isso, seus promotores têm divulgado que a engenharia de rodovias evoluiu muito e apresentam como prova disso, a nova pista da Rodovia dos Imigrantes, que causou menores impactos negativos que as obras tradicionais, por estar assentada sobre túneis e viadutos, em quase todo o seu percurso. Ao concordarmos que isso é uma evolução, criamos um problema para o governo, por esse alegar que não há recursos para se fazer o Rodoanel desse jeito.
Impressiona essa forma de tratar a inteligência do eleitor e os recursos do contribuinte...
Nada como a realidade para demolir os discursos. O trecho Oeste do Rodoanel, já implantado, traz tudo o que precisamos saber sobre ele; da falta de cuidados na construção, aos efeitos negativos de seu funcionamento, coroados pela ausência total de controles governamentais sobre a desobediência a normas técnicas na obra, a falta de resolução dos problemas gerados e o descumprimento das obrigações e responsabilidades sociais e ambientais, formalmente assumidas por ocasião de seu licenciamento.
Farta documentação, preparada por moradores próximos, instituições de pesquisa, organizações sociais, ambientalistas e alguns técnicos de prefeituras registra esses problemas que permanecem, em sua maior parte, sem solução.
A alegada “competência” da engenharia fica prejudicada por falhas graves no projeto e na própria execução da pista, que sofreu afundamentos e desbarrancamento de encostas por sondagens, projetos, taludes e drenagens mal feitas, em vários trechos. Dessas deficiências resultam acidentes, interrupções no tráfego do Rodoanel em si e das rodovias interligadas, além de dificuldades de acesso a caminhões de grande dimensão; justo a “clientela” utilizada para justificar a necessidade do Rodoanel.
Da extensa lista de compromissos assumidos como condição da obra ser permitida, poucas ações foram concluídas ou realizadas para reduzir os impactos negativos da obra. Mesmo assim, ela foi licenciada e colocada em funcionamento, evidenciando que o órgão ambiental responsável por essas licenças, que é subordinado ao governo que realiza a obra, se submeteu a ele e não à legislação que aplica aos demais cidadãos e
empreendedores.
Nesse contexto de falhas graves de engenharia, impactos negativos sem solução,
descumprimento de qualquer compromisso assumido ou exigência legal e sem que órgãos responsáveis exerçam qualquer controle, a quem podemos recorrer?
Isso é ainda mais grave se considerarmos que também houve o compromisso formal interno ao próprio governo estadual, em 1997, entre as secretarias de transportes, meio ambiente e transporte metropolitano de seguir diretrizes na concepção e implantação do Rodoanel. Essas diretrizes incluem a adoção de medidas necessárias ao
controle do maior impacto que essa obra pode ter: aumentar a velocidade de ocupação de toda a periferia, incluindo os mananciais.
Este impacto é ocasionado pela melhoria das condições de acesso a novas áreas, ainda desocupadas e protegidas, a partir de qualquer ponto da cidade ou de fora dela, considerando a falta total de controles e as políticas vigentes de ocupação.
Essas diretrizes, que incluíam a implantação de um parque contínuo, nos dois lados, ao longo de toda a rodovia em sua passagem pelos mananciais, não estão sendo
obedecidas e, ainda, os “estudos” contratados pelo empreendedor, para avaliar impactos descartaram qualquer influência significativa do Rodoanel na expansão da cidade.
Essas conclusões contrariam outras avaliações e a própria realidade. Já em 1997, empreendedores imobiliários anunciavam pela imprensa que a superfície da cidade iria duplicar com o Rodoanel, considerando as mudanças de centros atacadistas, de distribuição de mercadorias e de indústrias, além da valorização de áreas periféricas para a implantação de loteamentos de alto padrão. Apesar do próprio governo se utilizar desses argumentos como vantagens da obra, o “estudo” contratado conclui que isso não terá qualquer efeito no crescimento da cidade. É impressionante: o fenômeno existe apenas se for para “vender” a idéia do Rodoanel!
Ao mesmo tempo, a implantação do trecho Oeste foi mostrando o óbvio: a ocupação das últimas áreas que ainda conservavam alguma vegetação naquela região, piorando as condições de poluição do ar, das enchentes e da falta d’água para o abastecimento, seja ali, como no conjunto da região.
Agora, a mesma situação se repete nos mananciais do trecho sul e seus efeitos também já podem ser sentidos, antes mesmo da implantação da obra. Os negócios imobiliários estão aquecidos, os terrenos já apresentam valorização e estão sendo comercializados, contando com o acesso direto e indireto ao Rodoanel. Onde buscar essas evidências:jornais, revistas, imobiliárias e população em geral, além da visita à área.
Considerando que muita gente pobre foi empurrada para morar ali, essa valorização vai provocar o mesmo movimento de sempre: afastar esses moradores para lugares mais distantes e despreparados para recebê-los:
as últimas áreas que sobraram para produzir água. Como se pode ver, essa política governamental de expansão metropolitana, aproveita-se das obras, da falta de aplicação da lei, do desconhecimento da população, da mídia e das forças do mercado para se viabilizar.
Dentre seus efeitos mais dramáticos para a cidade, está a perda da capacidade de produção de água, que já é muito inferior à necessidade.
De acordo com os padrões que a ONU se utiliza para avaliar a disponibilidade de água, na Região Metropolitana de São Paulo a quantidade de água por habitante é mais de sete vezes pior à classificação mais crítica. Mais da metade da água que consumimos aqui vem de outras regiões, como a de Campinas (que está mais de três vezes pior que a situação mais crítica na classificação da ONU), onde a falta de água vem dificultando cada vez mais o desenvolvimento e o saneamento de dezenas de municípios e milhões de pessoas.
Nesse contexto de escassez, produzir água aqui parece ser um bom negócio. No entanto, mesmo que a legislação de proteção aos mananciais preveja - há décadas - compensações aos municípios produtores, o governo estadual também não aplica isso. O pouco que havia de recursos no orçamento para as ações de “Compensação Financeira a Municípios”,
foi cortado pelo governo estadual para 2006 e o mesmo ocorreu com as ações de “Desenvolvimento Sustentável”, destinadas a identificar alternativas de geração de emprego e renda adequadas à preservação ambiental no entorno das unidades de conservação.
Sem qualquer compensação pela água que produzem, nem alternativas econômicas permitidas e incentivadas pelo governo estadual e, ainda, recebendo continuamente os contingentes de excluídos do restante da metrópole, a esses municípios periféricos resta driblar as restrições legais (à urbanização, indústrias e demais atividades econômicas) da proteção aos mananciais, para se sustentarem. Esta situação pode ser
considerada mais uma das sólidas bases da política de expansão metropolitana.
Nesse contexto, qualquer obra ou investimento que lhes seja oferecido, passa a ser fundamental e, em face do nível de carência em que se encontram interessam, sobretudo, os benefícios de curto prazo. Efeitos negativos para a metrópole, como a ocupação dos mananciais, não preocupam a maioria desses municípios; ao contrário, já que isso pode significar alguma perspectiva de sustento e desenvolvimento.
Por essas razões, ao serem chamados a se manifestar sobre os impactos do Rodoanel, muito poucos municípios colocaram preocupações ou exigências de compensações significativas pelos impactos negativos que terão em relação a ele. Sem essas condições e não havendo exigências maiores do órgão licenciador - subordinado ao governo que quer realizar a obra e colher seus benefícios eleitorais no curto prazo -
poucas serão as chances de que sejam colocados controles, ou de que haja cobrança de condições para a obra.
Um dos argumentos utilizados pelo empreendedor para justificar o descumprimento dos compromissos do trecho Oeste foi a falta de recursos. No caso do trecho Sul, já foi amplamente noticiado que, por enquanto, há recursos para começar a obra, devendo o restante ser buscado e resolvido mais adiante. Novamente, vejamos como estão os
compromissos quanto aos investimentos que deveriam acompanhar o Rodoanel: os “Centros Logísticos Integrados” e o “Ferroanel” foram esquecidos na proposta orçamentária do governo, apesar de terem sido utilizados para justificar as condições da obra de resolver a questão do transporte de cargas. Recomeçamos bem!
Quem já acompanhou obras desse tipo sabe que não há nada pior que começar e parar, principalmente da forma que se anuncia, em várias frentes ao mesmo tempo. A destruição da vegetação e a realização de cortes e aterros para nivelar a estrada, abrem a possibilidade de destruição ainda maior dos mananciais, pois a ação das chuvas intensas daquela região, atingirá solos frágeis e de alta declividade, como são os trechos a serem percorridos pelo Rodoanel, causando a destruição de áreas ainda maiores, piorando os danos aos córregos e reservatórios.Além da falta de água, a situação da região metropolitana é agravada pela má qualidade daquela que já existe nos mananciais Guarapiranga e Billings – situação da qual a população não tem sido informada pelas autoridades responsáveis. As bacias desses reservatórios, ao serem percorridas pelo trecho Sul do Rodoanel, sofrerão efeitos que agravarão sua situação, podendo inviabilizar sua utilização. Isto porque o tratamento dessas águas já demanda pesados e crescentes investimentos na tentativa de torná-las potáveis, nem todos ainda realizados. Ainda que em nível insuficiente à necessidade, é nisto que o governo tem investido: tentar melhorar o tratamento à medida que a qualidade
da água vai piorando, ou tentar sanear alguns bairros situados dentro dos mananciais. Isto, depois que a ocupação avança e se consolida.
Coerentemente com a política metropolitana de expansão: nada de prevenção!
Mesmo com essas tentativas atrasadas e muito inferiores à necessidade, o governo corta os poucos recursos destinados a elas no seu orçamento, como está ocorrendo para este ano de 2006.
Apesar da retórica de que as questões ambientais são importantes, a realidade, as atitudes na viabilização do Rodoanel e os recursos nos dão outro quadro: houve redução na participação, já inexpressiva, da Secretaria do Meio Ambiente (de 0,56% para 0,51%) no orçamento do Estado, implicando na redução ou manutenção de recursos irrisórios para ações como as de “Controle Ambiental” e “Recuperação de Áreas
Degradadas”, entre outras.
Mesmo aprovadas na Lei de Diretrizes Orçamentárias, desapareceram da proposta orçamentária do governo ações como a de “Controle de Ocupações Irregulares em Áreas de Proteção e Recuperação de Mananciais da Grande São Paulo”. Já os programas de “Planejamento e Gestão Ambiental para o Desenvolvimento Regional Sustentado” e o de “Saneamento Ambiental em Mananciais de Interesse Regional” tiveram seus recursos reduzidos para menos da metade.
Tratando-se de resgate social àquelas comunidades sucessivamente marginalizadas, também sofreram redução no orçamento para 2006 os recursos que vinham sendo destinados a programas habitacionais como “Morar Melhor”, “Atuação em Cortiços” e “Urbanização de Favelas e de Núcleos Habitacionais”. Recursos também inexpressivos em relação à demanda habitacional foram destinados para o Programa “Saneamento
Ambiental em Mananciais de Interesse Regional” e a ação “Mananciais do Alto Tietê”.
Como enfrentar essas mazelas e proteger o que restou?
Há um longo caminho a ser percorrido, que deve começar, pela sua urgência, em relação ao Rodoanel. Nesse sentido, deve ser exigido do empreendedor – aqui entendido como a Dersa e o conjunto do governo estadual - como condição básica para o licenciamento, as seguintes providências:
1. Honrar compromissos assumidos anteriormente:
a. Reparar os passivos e cumprir o que foi acordado em relação ao trecho Oeste;
b. Cumprir as diretrizes que foram acordadas em 1997 entre as Secretarias de Estado de Transportes, Meio Ambiente e Transportes
metropolitanos – que incluem o equacionamento de uma política metropolitana, com os municípios atingidos, além do parque linear em todo o percurso nos mananciais e não apenas no Município de São Paulo;
2. Adotar garantias adicionais ao cumprimento dos compromissos:
a. Antecipar as compensações e mitigações em relação às obras da rodovia em si;
b. Arcar, permanentemente, com os recursos necessários à manutenção das áreas protegidas a serem criadas como compensação;
c. Criar comissão independente, integrada por um colegiado de representantes da universidade e de ONGs para avaliar o andamento e o cumprimento das exigências e medidas de caráter ambiental, que deverá atestar esse cumprimento, periodicamente, como condição para a liberação dos trechos de obra e das sucessivas licenças;
d. As ações de responsabilidade técnica no exercício da engenharia não poderão ser consideradas como medidas de caráter ambiental e o seu descumprimento deverá sujeitar os infratores, entre outras, a penas limitadoras do exercício da profissão, devendo ser acompanhadas por comissão específica;
e. A obra deverá ser concebida para, a exemplo da nova pista da Rodovia dos
Imigrantes, minimizar o apoio no solo, contando com obras de arte, particularmente em função de dois fatores:
i. A fragilidade das áreas pelas quais deverá passar e;
ii. Porque essa obra da Imigrantes foi utilizada pelos promotores do Rodoanel como exemplo de que a engenharia no país está desenvolvida o suficiente para não causar impactos (se ela serve como argumento de defesa, vamos aceitá-la).
3. Evitar os maiores impactos da obra:
a. Definir estratégia para reorientação da expansão urbana para fora dos mananciais, indicando os responsáveis, prazos e custos articulados às diferentes fases do Rodoanel;
b. Viabilizar o programa de saneamento ambiental dos mananciais, revisto para incluir como prioritárias em termos de prazo, alocação de recursos e metas as ações preventivas à ocupação dos mananciais.
Essa relação de propostas deverá ser ampliada e melhorada para constituir um ponto de partida. Resgatar a competência e a credibilidade governamentais pressupõe um longo processo que incluirá, necessariamente, a reorientação da atual política metropolitana, que vem reduzindo as nossas perspectivas para o futuro.

Um comentário:

  1. Não dá mais pra dormir por causa desta obra do Rodoanel!!! Faz duas semanas q até de madrugada o barulho da obra continua, moro a uns 5 metros da obra e todo santo dia só vou conseguir dormir quase 6h da manhã.. e detalhe.. tenho q acordar quase 8h pra ir trabalhar.. é um absurdo!!!! Além do barulho das maquinas os funcionários ficam berrando!!!

    ResponderExcluir